domingo, 13 de maio de 2012

A Ditadura Civil-Militar brasileira nas telas de cinema [Thaís Choucair] #2



           Em primeiro lugar, peço desculpas. Cometi um erro na primeira parte do meu projeto: a ditadura brasileira é erroneamente nomeada de ditadura militar. O nome correto e defendido por toda a comunidade acadêmica e política hoje em dia é ditadura civil-militar. Um simples termo altera substancialmente essa história: a participação do setor empresarial e jurídico é inegável - os militares não agiram sozinhos. Com tudo esclarecido, voltemos ao projeto.

           Após analisar dois filmes bem próximos ao fim da ditadura, é hora de avançar um pouco no tempo. Em 1994, é lançado o filme Lamarca, dirigido por Sérgio Rezende, trazendo a história de Carlos Lamarca, ex-capitão do exército brasileiro que, ao desertar, entrou para a luta armada contra o regime.  Ao assistir o filme, percebi que ele foca a trajetória do personagem, e destaca a luta, as armas de fogo, a violência, tanto do lado dos militares, quanto do lado da resistência. Essa preferência é, no mínimo, polêmica, e, num âmbito maior, coloca uma questão interessante. É sabido que: 1. Apenas uma parcela ínfima da resistência à ditadura resolveu aderir à luta armada; 2. O movimento estudantil foi um dos, se não o maior, destaque quando pensamos na luta contra a ditadura; 3. As feridas deixadas pelo regime militar eram muito maiores que a tortura - outras coisas como a censura, o corte de programas de alfabetização, etc., são, talvez, mais traumáticos. Nenhum desses três pontos é considerado no filme Lamarca. E aí entra a questão: em que medida um filme, ao tratar de uma história tão relevante a uma sociedade, tem a licença histórica de retratar de maneira tão divergente um período? Se nenhum filme é um recorte real, pois isso é impossível, como condenar um e qualquer outro não? Porém, como não questionar uma película que faz um recorte tão omisso?


       Essa mesmíssima questão está presente no segundo filme dessa quinzena. O que é isso Companheiro?, de 1997, dirigido e produzido por Bruno Barreto, que levanta ainda mais polêmica. Mais que isso: a licença histórica a que ele se apossou chegou a chatear e ferir diversos envolvidos do episódio que o filme narra. Um grupo de resistência, no auge da ditadura civil-militar, ao se ver sem nenhuma forma de serem ouvidos, sequestram o embaixador americano e, como resgate, pedem que 15 presos políticos sejam soltos e que uma carta, feita pelo grupo, seja lida em rede nacional. Sobre o embaixador americano, é evidente que, dentro do filme, ele é o mais sensato, aquele que nunca mostra um lado passível de crítica, aquele que tem a cabeça aberta e escolhe sempre “o lado certo”. Já todos os outros personagens (ou a maioria, ou os principais), sofrem a proposta da negação do maniqueísmo, ou seja, mostram virtudes e defeitos, mostram um lado humano e outrora um lado mais próximo do mal. 
       Concomitante a isso, temos no filme várias cenas faladas em inglês, até mesmo narração em inglês, quando (e aí podemos destacar outro aspecto importante) o embaixador descreve os militantes. Ou seja, a imagem de cada militante é levada a ser criada no imaginário do espectador com grande tendência àquela descrita pelo estadunidense que fora sequestrado. Além de todo esse destaque ao embaixador e essa evidente áurea criada nele, temos um aspecto cinematográfico que se relaciona aos fatos anteriormente apontados nesse parágrafo: o filme é voltado para a ação, o filme é construído em torno do sequestro, em torno do que aconteceria. As cenas são fortes, em todos os vieses, através da cena em si, da atuação da cena em si, e não através da construção dos personagens e da montagem das cenas. Isso é relevante na discussão começada pois essa preferência à ação presente na película é enormemente perceptível em diversos filmes da mesma época produzidos e aclamados mundialmente. Como é sabido, até hoje e principalmente naqueles anos, a produção midiática de todo o tipo foi influenciada e dominada pela escola americana, não importando aqui o mérito dessa influência. 

        Ora, se o embaixador americano foi construído de tal forma, se temos diversas falas e narrações em inglês, se a produção segue padrões na moda americana, “O que é isso, Companheiro?” se preocupa mais com o caráter histórico do que apresentava ou com a repercussão do filme em si?


         Nota: Observem as capas dos filmes. Nas duas temos o vermelho, a arma, a ação.

2 comentários:

  1. Oi, Thaís. Gostei bastante do seu post, dessa vez você foi mais crítica e colocou seu ponto de vista no texto, o que é muito bom (embora eu acho que você esteja sendo muito dura com os filmes, particularmente com o 'O que é isso companheiro').
    Seu texto está muito bem escrito - mas tenho a impressão de que ele ultrapassou o tamanho proposto, não? Abraço e bom trabalho.

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  2. Thaís, concordo com a Cris! Legal você ter se colocado mais no textos, suas impressões.
    Tome cuidado com o tamanho do texto!

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