Nesse post o filme de Kusturica
abordado vai ser Underground – mentiras
de guerra. Por ser um filme profundamente político, com uma carga muito
mais forte que os outros que já vi, imaginei inicialmente que havia feito uma
escolha equivocada para falar da temática do fantástico. Mas como não poderia
deixar de ser, Kusturica surpreende também nesse quesito.
O contexto é o período
compreendido entre a Segunda Guerra Mundial, Guerra Fria e uma posterior “Guerra
na Iugoslávia”, onde se passam os conflitos retratados. Me abstendo de questões
ideológicas que o acusaram posterimente de fazer propaganda de certas posturas,
tentei pensar mais as sutilezas do filme. As rudezas e crueldades da guerra são
de tal formas escancaradas que assustam, mas as diversas metáforas e a utilização de elementos fantásticos permite
desvelar na tela sentimentos que não podem, na minha opinião, ser reproduzidos
em uma liguagem simplesmente oral . A música tem um papel fundamental para
alcançar esse objetivo, de caráter cigana possui uma carga expressiva muito
grande assim como um ritmo marcado e acelerado, que funciona como uma caratse
de sentimentos.
A principal metáfora utilizada foi o
enclausuramento de várias pessoas no porão, mantidas ali por 20 anos
acreditando na existência da Guerra, mesmo após seu término. A sensação
transmitida é a de sufocamento, devido a restrição de luz, e ar puro que são
submetidas. É forte a idéia de farça, mantida nessa estratégia forjada por
Marko, um dos personagens, sensação que pode ser ampliada para o próprio
contexto de lutar em uma guerra, em que muitas vezes uma comunidade é induzida
a sentir ódio por outra semelhante. “Querida, uma guerra não é guerra, enquanto
um irmão não matar o outro”. Atitude levada ao extremo pela morte de Marko pelo
seu irmão
Um elemento muito interessante em
meio a essa turbulência é um poço que se encontra dentro do porão. Por anos a
fio as pessoas que ali viviam só podiam ver ali a sua imagem refletida, e com
isso, esse tivesse o poder de armazenar os
seus desejos mais profundos e a possibilidade de suavização da realidade. Em
lindas cenas filmadas embaixo dágua mostra o reencontro de pessoas amadas que
se jogaram no poço, amigos e amantes vivos, assim como os já mortos. No fim do
filme todos convivem harmonicamente a beira de um rio, sem o ódio presente da
guerra, apesar de apresentarem marcas.O barranco em que se encontram se
desprende do continente, o que sugere levar a lugares desconhecidos, em que
novas convivências e identidades poderiam ser construídas. Dígno da Palma de
Ouro recebido em Canes em 95.
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