"Imagens de órgãos genitais; relações vaginal e anal; cunilíngua; felação; masturbação; práticas individuais, em grupo ou envolvendo figuras místicas trazem o grande desafio de serem avaliadas por pesquisadores contemporâneos, que se encontram distantes, temporal e culturalmente, dos valores que foram originadas."
(FEITOSA, Lourdes M. G. Conde. Amor e sexualidade no popular pompeiano: uma análise de gênero em inscrições parietais. Campinas: Unicamp, 2002; Tese de Doutoramento)
Grafites de cunho sexual |
*As fontes e exemplificações desta quinzena são alternativos à dita bibliografia principal, devido à greve da biblioteca da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG. A temática da postagem, no entanto, se mantém a mesma: sexualidade, erotismo e a publicidade relacionada aos prazeres do álcool e do sexo oferecidos na Pompeia antiga.
A afetividade, a sexualidade e as diferenças de gênero tinham definições próprias no momento clássico da Antiguidade. Os prazeres carnais, como visto nas inscrições pompeianas, eram presentes na vida comum popular, considerando-se o grande número de tabernas e prostíbulos. O erotismo mesclado com as interações sociais eram traduzidas em desenhos e textos inscritos nos estabelecimentos onde se vendiam álcool e sexo. Seus autores eram desde os próprios consumidores e donos dos bares, até prostitutas.
Devido à complexidade da definição de sexo, amor e sexualidade, não cabe à este Projeto responder questões relativas à tal temática. Este apenas se compromete em desmembrar um básico contexto social, que se liga às inscrições de cunho sexual registrados na Pompéia antiga.
Devido à complexidade da definição de sexo, amor e sexualidade, não cabe à este Projeto responder questões relativas à tal temática. Este apenas se compromete em desmembrar um básico contexto social, que se liga às inscrições de cunho sexual registrados na Pompéia antiga.
Os pompeianos comuns, alheios à aristocracia local, geriam em seu tempo uma ativa vida boemia e cultural, ligada principalmente aos prazeres carnais, que se mostram para estes indivíduos como caminhos de evasão de uma árdua rotina de trabalho e submissão. Segundo o historiador Pedro Paulo Funari, "a cultura popular não deixa de ser caracterizada pelas contradições originadas no seio das camadas subalternas. Suas cosmovisões refletem, num só tempo, a aceitação e a recusa das condições de exploração material e espiritual no interior da sociedade (...)". A população fugia de sua realidade de obrigação e exploração, utilizado de uma criatividade erótica, em seu próprio imaginário sexual, compartilhando-o ao público. Evidencia-se, portanto, um contexto que atravessa o entendimento da sexualidade e toma forma social: a ânsia da evasão denuncia o sentimento de opressão sentido por este povo comum, ocupado com o trabalho e sem acesso aos grandes luxos da elite.
Outros conceitos trabalhados na tese de Lourdes Conde Feitosa, relacionados à pesquisa de J. N. Abrams sobre o linguajar sexual latino, esclarecem o âmbito da sexualidade feminina: "Adams (...) considera que tais inscrições podem sugerir propagandas feitas por prostitutas sobre a capacidade sexual dos seus clientes". A mulher seria apresentada numa perspectiva sexualmente ativa e, como sugere Feitosa, "o uso do verbo 'foder' é frequentemente na voz ativa - 'eu fodo', 'eu possuo', tanto para o masculino, quanto para o feminino. Isso pode ser representado em grafites onde a mulher é representada como possuidora."
Grafites publicitários escritos em tabernas |
Os muros das tabernas também muito serviram como espaço publicitário, de crítica ou notificação, por parte dos clientes e proprietários. Anúncios de recompensas, reclamações sobre o serviço do bar e recomendações aos clientes: são muitos os exemplos da manifestação escrita em tais locais. Ainda assim, é possível perceber a oposição existente entre grupos menores, distintos, porém não-pertencentes à elite. Donos de casas que impunham normas para seus clientes, ao mesmo tempo que clientes que criticavam o produto servido ou o atendimento: a insatisfação acabava por ser notada, partilhada ou negada. Criava-se, então, uma esfera de discurso através dos grafites, formando um modo de comunicação popular compatilhada, conflituosa e verbalmente viva.
Olá, Lucas. Bem interessante essas inscrições. Mas continuo sem entender bem a natureza dessas imagens que a gente vê - escritas em português e em fundo negro. Por que foram traduzidas, por quem? Fico sentindo falta de ver a materialidade das tabernas, a parede, a rua... No mais, você está indo bem.
ResponderExcluirAbraço!
É impressão minha ou sua postagem ultrapassou o limite de caracteres?
ResponderExcluirOlá Cristiane,
ResponderExcluirO limite de caracteres foi sim ultrapassado. Tomarei maior precaução nas seguintes postagens.
As inscrições vieram agrupadas, sendo que não houve uma contextualização individual para cada exemplo. Isso se deve à fatores externos que me impediram de seguir a bibliografia principal, como a greve dos servidores nas bibliotecas da UFMG, a falta de cópias destes livros nas bibliotecas públicas e até nas livrarias e distribuidoras, nas quais ainda tento contactar o estoque. Sendo assim, não me senti possuidor de grande critério para poder analisar tais exemplificações, me redimindo apenas a a exemplificar um contexto geral, que englobasse todos estes exemplos, de acordo com uma nova bibliografia limitada. Os grafites da primeira imagem, exceto o de código III 8896, foram retirados da tradução encontrada na tese de Feitosa, e os da segunda imagem foram de tradução livre feita por mim, com o meu comprometimento. A recusa de imagens das próprias paredes e o uso apenas representações de texto e desenhos foi uma própria escolha, pois penso que a bruta materialidade e o contato direto com esta fonte impede uma aproximação alternativa desta realidade, e optei seguir neste projeto uma corrente de desenvolvimento que evitasse o óbvio. No entanto, compreendo a necessidade que o leitor teria de obter uma maior aproximação do assunto em si e procurarei trazer um mais desta realidade bruta e material nas próximas postagens.